Illness name: sifilis
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O que é sífilis?
A sífilis é uma doença infecto-contagiosa transmitida principalmente pela via sexual. O agente causador é a bactéria Treponema pallidum , cujo sintoma mais comum é uma úlcera indolor na região genital.
Quando não tratada adequadamente, a sífilis desenvolve-se como uma doença de três estágios: sífilis primária, secundária e terciária. Cada estágio possui sintomas diferentes e nas fases mais avançadas, a doença pode se espalhar pelo organismo, provocando graves lesões de órgãos internos, como o coração e o cérebro, e lesões deformantes na pele.
Na era pré-antibióticos, a sífilis era uma doença crônica, prolongada, dolorosa e deformante, sendo extremamente temida e muito estigmatizada. Atualmente, porém, ela é uma doença de fácil tratamento com antibióticos e com elevada taxa de cura. A imensa maioria dos casos é diagnosticada nos estágios 1 ou 2 e os pacientes conseguem ficar curados sem maiores sequelas.
Formas de transmissão
A transmissão do T. pallidum ocorre na imensa maioria dos casos pela via sexual e se dá pela penetração da bactéria através de microscópicas feridas ou abrasões na mucosa da vagina ou do pênis.
Estima-se que o risco de contágio em cada relação sexual desprotegida com parceiro infectado seja de aproximadamente 30%. Se houver feridas ou inflamações na vagina/pênis, esse risco é ainda mais elevado.
Os pacientes que transmitem o T. pallidum são aqueles que apresentam a doença na fase primária ou secundária, principalmente se houver lesões ativas nos órgãos sexuais. Apesar de não ser 100% eficaz, a camisinha ainda é o melhor método para prevenir a transmissão por via sexual.
Nas fases mais avançadas da doença, a bactéria pode ser transmitida por beijos e até pelo toque na pele ou na boca, caso haja lesões ativas, conforme será explicado mais à frente.
Atualmente, a transmissão da sífilis por transfusão sanguínea é muito rara, uma vez que o Treponema pallidum não sobrevive por mais de 48 horas nas atuais condições que os bancos de sangue estocam o sangue.
Existe também a sífilis congênita, que é aquela adquirida pelo feto quando a mãe encontra-se contaminada pelo Treponema pallidum durante a gestação. A infecção na grávida pode causar aborto, parto prematuro, má formações e morte fetal. Nesse artigo, falaremos especificamente da sífilis nos adultos. Se você procura informações sobre a forma congênita, leia: Sífilis Congênita – Sintomas e Tratamento .
Sinais e sintomas
Conforme já dito, a infecção pelo Treponema pallidum é dividida em três estágios, denominados sífilis primária, secundária e terciária.
Sintomas da sífilis primária
O período de incubação, ou seja, o intervalo de tempo entre o contágio e os primeiros sintomas, é em média de 2 a 3 semanas. Todavia, há casos em que este intervalo pode ser tão curto quanto três dias ou tão longo quanto três meses.
A lesão da sífilis primária é uma pápula (uma pequena elevação na pele) nos órgãos genitais, que em poucas horas se transforma em uma úlcera não dolorosa. Nas mulheres, essa lesão pode passar despercebida, visto que é pequena (em média 1 cm de diâmetro), indolor e costuma ficar escondida entre os pelos pubianos ou dentro da vagina.
A úlcera da sífilis recebe o nome de cancro duro. Após 3 a 6 semanas, a lesão desaparece mesmo sem tratamento, levando à falsa impressão de cura espontânea. Não há outros sintomas associados à lesão primária. Além do cancro, o paciente pode apresentar, no máximo, aumento dos linfonodos da virilha (ínguas).
Em alguns casos, a úlcera pode surgir na boca ou na faringe, caso a transmissão tenha se dado através do sexo oral.
Portanto, a sífilis inicialmente é uma doença indolor, que costuma passar frequentemente despercebida e desaparece espontaneamente após algum tempo. Esse é o grande problema. Qualquer tratamento, por mais ineficaz que seja, pode passar a impressão de ser eficaz, porque o cancro desaparecerá de uma forma ou de outra. Esse desaparecimento, porém, não significa cura, pelo contrário, a bactéria pode estar se multiplicando e se espalhando pelo organismo silenciosamente.
Para ver imagens reais de lesões da fase primária, clique no link: Fotos de sífilis .
Sintomas da sífilis secundária
Em 25% dos pacientes não tratados na fase primária, a sífilis retorna após algumas semanas ou meses. Só que agora, a doença está disseminada pelo organismo. Em alguns casos, o paciente só descobre que está infectado na fase secundária, pois a lesão primária pode ter passado despercebida na época.
A sífilis secundária se manifesta com erupções na pele, classicamente nas palmas das mãos e solas dos pés. Também são sintomas comuns: febre, mal-estar, perda do apetite, dor nas articulações, queda de cabelo, lesões oculares e aumento dos linfonodos difusamente pelo corpo.
A apresentação com lesões nas solas dos pés, palmas das mãos e mucosa oral é a forma mais característica, mas as erupções de pele podem ocorrem em qualquer local do corpo.
Outra lesão típica da sífilis secundária é o chamado condiloma lata , uma lesão úmida, com aspecto de uma grande verruga, que surge geralmente próximo do local onde existiu a lesão do cancro duro na fase primária.
Há casos, porém, em que a sífilis secundária apresenta poucos sintomas, fazendo com que o paciente não dê muita importância ao quadro. Cerca de 20% dos pacientes na fase secundária não consideram seus sintomas incômodos o bastante para procurarem ajuda médica.
Assim como ocorre na fase primária, os sintomas da sífilis secundária desaparecem espontaneamente, sem qualquer tratamento.
Fase latente da sífilis
Após o desaparecimento das lesões na fase secundária, o paciente entra na fase latente da doença. Não há sintomas, mas os testes laboratoriais para sífilis são positivos (explico mais adiante). A fase latente é dividida em latente precoce, quando a contaminação pelo Treponema pallidum ocorreu há menos de 1 ano, ou latente tardia, nos casos de infecção há mais de um ano.
Sintomas da sífilis terciária
Os pacientes podem ficar vários anos, inclusive décadas, assintomáticos na fase latente antes de um novo retorno da doença. Esta nova fase, quando os sintomas retornam, é chamada sífilis terciária, a forma mais grave da doença.
A fase terciária apresenta três tipos de manifestações:
- Goma sifilítica: grandes lesões ulceradas que podem acometer pele, ossos e órgãos internos.
- Sífilis cardiovascular: acometimento da artéria aorta, causando aneurismas e lesões da válvula aórtica (leia: O que é um aneurisma? ).
- Neurosífilis: acomete o sistema nervoso, lavando à demência, meningite , AVC e problemas motores por lesão da medula e dos nervos.
Diagnóstico Sorológico
Na sífilis primária, quando aparece o cancro duro, ainda não houve tempo do organismo produzir anticorpos contra o Treponema pallidum , por isso, os exames de sangue costumam estar negativos nesta fase.
A confirmação laboratorial pode ser feita após coleta de material da úlcera para visualização direta da bactéria em microscópio. Nem sempre esse exame é necessário, visto que a úlcera genital é bem característica. Geralmente, o médico inicia tratamento baseado apenas em dados clínicos, esperando uma ou duas semanas para confirmar o diagnóstico laboratorialmente.
O diagnóstico da sífilis é habitualmente feito através de dois exames sorológicos: VDRL (ou RPR) e FTA-ABS (ou TPHA).
Testes não treponêmicos – VDRL e RPR
O VDRL e o RPR são chamados testes não treponêmicos, pois eles pesquisam anticorpos não contra a bactéria Treponema pallidum em si, mas sim contra uma combinação de antígenos chamados cardiolipina, colesterol e lecitina. Apesar de ser um teste de fácil realização, exatamente por não pesquisar diretamente o Treponema pallidum, existe um maior risco de resultados falso-positivos.
O VDRL é o exame mais simples e mais utilizado como rastreio da sífilis. O seu resultado é dado em formas de diluição, ou seja, um resultado 1/8 (1:8) significa que o anticorpo foi identificado até 8 diluições; um resultado 1/64 mostra que podemos detectar anticorpos mesmo após diluirmos o sangue 64 vezes. Quanto maior for a diluição em que ainda se detecta o anticorpo, mais positivo é o resultado. Se você achou a explicação ficou confusa, apenas saiba que o VDRL de 1/2 é um título mais baixo que 1/4, que é mais baixo que 1/8 e assim por diante. Quanto mais alto o título, mais positivo é o exame.
O VDRL costuma ficar positivo entre 4 e 6 semanas após a contaminação. Geralmente, seus valores começam a subir uma a duas semanas após o aparecimento do cancro duro. Portanto, se o teste for feito precocemente, um ou dois dias após o aparecimento da lesão da sífilis, o resultado pode dar falso negativo.
VDRL falso-positivo
O VDRL pode ser falsamente positivo em 1 a 2% da população. Casos de falso-positivo costumam ocorrer em pacientes com mais de 70 anos, usuários de drogas injetáveis e em várias outras doenças que não sífilis, como lúpus , doenças do fígado , mononucleose , hanseníase , catapora , artrite reumatoide , etc. Geralmente, resultados falso-positivos apresentam títulos abaixo de 1/8, mas títulos de até 1/256 já foram descritos em pacientes sem sífilis.
É importante destacar que apesar dos pacientes infectados habitualmente terem títulos acima de 1/16, é perfeitamente possível que um paciente contaminado tenha títulos de VDRL baixos. Por isso, todo resultado positivo deve ser confirmado com testes troponêmicos, como no caso do FTA-ABS, que será explicado a seguir.
Testes treponêmicos – FTA-ABS, MHA-TP / TPHA / TPPA e ELISA
Os testes treponêmicos são aqueles que pesquisam diretamente a bactéria Treponema pallidum. Apesar de mais específicos, são de realização mais complexa, motivo pelo qual não costumam ser utilizados como primeira opção para o rastreio.
O FTA-ABS é o teste treponêmico mais utilizado. Sua janela imunológica é mais curta, podendo estar positivo já após alguns dias depois do aparecimento do cancro duro e sua taxa de falso positivo é mais baixa que a do VDRL.
Uma vez positivo, o FTA-ABS assim permanecerá, mesmo após a cura do paciente. Já os valores do VDRL caem progressivamente após a cura, tornando-se negativos após alguns anos.
Habitualmente, o VDRL é usado para rastreio da doença e o FTA-ABS para confirmação quando o primeiro teste é positivo.
Obs: O FTA-ABS é um pouco superior ao TPHA, apresentando uma sensibilidade maior.
Interpretação dos resultados
Durante a investigação de uma quadro de sífilis, podemos nos deparar com as seguintes situações:
- VDRL positivo e FTA-ABS positivo confirmam o diagnóstico.
- VDRL positivo e FTA-ABS negativo indicam outra doença que não sífilis.
- VDRL negativo e FTA-ABS positivo indicam sífilis em fase bem inicial, já curada ou na fase terciária.
- VDRL negativo e FTA-ABS negativo descartam o diagnóstico de sífilis (há raros casos em que o teste é feito muito precocemente, podendo haver falso negativo em ambos).
Tratamento
O tratamento da sífilis muda conforme o estágio da doença:
- Sífilis primária, secundária ou latente precoce: Penicilina benzatina (Benzetacil) 2.4 milhões de unidades em dose única.
- Sífilis com mais de 1 ano de evolução ou de tempo indeterminado: Penicilina benzatina (Benzetacil) 2.4 milhões de unidades em 3 doses, com uma semana de intervalo entre cada.
Os casos com acometimento do sistema neurológico (neurossífilis) não devem ser tratados com penicilina benzatina , mas sim com penicilina G cristalina ou penicilina G procaína.
O tratamento deve sempre ser feito com penicilina, inclusive nas grávidas e nas mulheres amamentando. Outros antibióticos só devem ser utilizados caso o paciente seja alérgico à penicilina.
Em alguns casos, como na infecção em grávidas, pode ser indicado um tratamento para dessensibilizar a paciente alérgica para ela poder ser tratada com penicilina.
Os pacientes com alergia à penicilina podem ser tratados com doxiciclina (100 mg 2 vezes por dia por 14 dias) ou azitromicina (dose única de 2 gramas), mas eles não são tão eficazes quanto a penicilina e há um maior risco de induzir resistência.
A sífilis tem cura?
Sim, a sífilis tem cura se for tratada com antibióticos apropriados, de preferência com penicilina benzatina (Benzetacil) nas doses indicadas acima. Quando tratada corretamente, a taxa de cura é maior que 95%.
Após o início do tratamento as lesões começam a desaparecer já nos primeiros dias. Porém, para se confirmar a cura é preciso repetir os exames de sangue.
Para saber mais sobre o tratamento, leia: Sífilis tem cura?
Critérios de cura
Todo paciente tratado deve refazer o VDRL com 6 e 12 meses. O critério de cura da sífilis é o desaparecimento dos sintomas e uma queda de 4 vezes (2 titulações) nos níveis de anticorpos. Exemplos:
- VDRL era 1/64 e após o tratamento caiu para 1/16.
- VDRL era 1/32 e após o tratamento caiu para 1/8.
- VDRL era 1/128 e após o tratamento caiu para 1/32.
Quanto mais tempo se passa, mais caem os títulos, podendo até ficarem negativos após alguns anos (há pacientes curados que permanecem a vida inteira com títulos baixos, como 1/2 ou 1/4). Não é preciso que o VDRL fique negativo para se atestar a cura da sífilis.
Os títulos na sífilis primária caem mais rapidamente que na forma secundária e terciária. O FTA-ABS não serve para controle de tratamento, pois, como já foi explicado, ele não fica negativo após a cura. Uma vez positivo, o FTA-ABS assim ficará para o resto da vida. É o que chamamos cicatriz imunológica.
Referências
- Testes para diagnóstico da Sífilis – Ministério da Saúde.
- Syphilis – Harrison’s Principles of Internal Medicine 19th ed.
- Syphilis infection – BMJ BestPractice.
- Sexually transmitted diseases treatment guidelines, 2015 – Centers for Disease Control and Prevention.
- 2014 European Guideline on the Management of Syphilis – The International Union against Sexually Transmitted Infections (IUSTI).
- Syphilis Detection Test – Medscape.
- Syphilis: Epidemiology, pathophysiology, and clinical manifestations in HIV-uninfected patients – UpToDate.
- Syphilis: Treatment and monitoring – UpToDate.
- Syphilis: Screening and diagnostic testing – UpToDate.
- Syphilis – World Health Organization.
Autor(es)
Dr. Pedro Pinheiro
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.