Illness name: cistite
Description:
O que é cistite?
A infecção urinária é uma doença extremamente comum, principalmente no sexo feminino. Cerca de 60% das mulheres adultas terão pelo menos um episódio de infecção do trato urinário (ITU) durante a vida.
Existem três tipos de infecção urinária:
- Cistite: infecção da bexiga.
- Pielonefrite : infecção dos rins.
- Uretrite : Infecção da uretra.
A cistite, tema deste artigo, é uma inflamação da bexiga – e também da uretra em muitos casos – causada por uma infecção bacteriana, na maioria dos casos pela bactéria Escherichia coli . A cistite é habitualmente uma doença de simples tratamento, porém, pode ser dolorosa e inconveniente.
A infecção da bexiga pode se tornar um grave problema de saúde se as bactérias se deslocarem para os rins, causando o que chamamos de pielonefrite. Enquanto a cistite é uma doença simples, a pielonefrite pode levar à sepse e consequentemente à morte por infecção generalizada.
Como se “pega” infecção urinária?
Na verdade, a expressão “pegar infecção urinária” não é a mais apropriada, já que a cistite não é uma doença contagiosa, que se passa de uma pessoa para outra.
Mais de 80% das infecções urinárias são causadas por uma bactéria que vive no nosso intestino, chamada Escherichia coli (E.coli) .
A infecção urinária ocorre quando essas bactérias, que deveriam permanecer no trato intestinal, conseguem colonizar a região ao redor da vagina. A colonização da região vaginal é o primeiro passo para o desenvolvimento da cistite. Bactérias vindas dos intestinos que conseguem se estabelecer ao redor da vagina têm mais facilidade em penetrar a uretra e alcançar a bexiga.
As cepas de E.coli que causam infecção urinária são inofensivas se permanecerem dentro do intestino. Elas só causam doença se atingirem outros órgãos do corpo, como a bexiga. Além da E.coli , outras bactérias do trato intestinal também podem causar cistite, entre elas: Proteus mirabilis, Enterococcus e Klebsiella pneumoniae .
Cistite nos homens e nas mulheres
A imagem abaixo mostra a anatomia do trato urinário inferior da mulher e do homem. Repare como a saída da uretra na mulher fica muito próxima do ânus do que a masculina. Além disso, a uretra do homem é mais extensa, fazendo com que a E.coli tenha que percorrer um caminho maior até chegar à bexiga.
Isto significa que anatomicamente é muito mais fácil para as bactérias vindas do ânus alcançarem a bexiga da mulher do que a bexiga do homem. Portanto, a anatomia geniturinária explica o porquê das mulheres terem cistite com frequência e os homens não.
Há, entretanto, situações em que esta vantagem anatômica não é suficiente para proteger os homens da infecção urinária. Alguns exemplos:
1. Sexo anal ativo (homo ou heterossexual): a penetração do pênis no ânus elimina essa distância anatômica que protege os homens. A saída da uretra do pênis fica em contato direto com as bactérias intestinais. A E.coli neste caso é jogada diretamente na uretra, tendo apenas que atravessá-la para chegar a bexiga. O sexo anal ativo sem preservativo é, portanto, um atalho para infecção urinária.
Ainda assim, mesmo em homens que praticam sexo anal, a cistite não é uma doença comum. Além da barreira anatômica, há outros fatores que dificultam a cistite no sexo masculino. A região ao redor da uretra masculina é uma área menos úmida que nas mulheres, o que dificulta a colonização por bactérias. Além disso, no líquido prostático, eliminado durante o ato sexual, há substâncias antibacterianas.
2. Doenças da próstata: homens mais velhos costumam ter a próstata aumentada de tamanho, o que comprime a uretra e causa obstrução à saída de urina. O ato de urinar protege contra a cistite, pois a urina ajuda a carregar as bactérias que estejam alojadas na bexiga e uretra. Como a próstata obstrui, mesmo que parcialmente, a uretra, a bexiga fica sempre com um reserva de urina em seu interior, sendo um ótimo meio para multiplicação de bactérias.
Portanto, sempre que um homem adulto apresentar mais de um episódio de infecção urinária, deve-se pensar em alguma alteração anatômica, como doenças da próstata ou lesões da bexiga.
Como evitar infecções urinárias?
A maioria das pessoas costuma pensar que, se a cistite surge quando bactérias normalmente encontradas nas fezes colonizam a região vaginal, é só lavar bastante a vagina e a região ao seu redor para matar essas intrusas e impedir a infecção. A cistite seria, portanto, uma doença de gente que não se lava direito. Este raciocínio está ERRADO! Na medicina, nem sempre o mais lógico é o que acontece.
Vamos aos fatos. A vagina das mulheres apresenta sua própria flora de bactérias, que são inofensivas. Para uma bactéria vinda do ânus colonizar essa região, ela precisa competir com as que já vivem no local. Quando se faz uma higiene íntima excessiva matamos a flora natural da vagina, facilitando muito o processo de colonização de germes que chegam. O que a E.coli mais quer ao chegar na região em volta da vagina é poder se multiplicar à vontade, sem ter que “brigar” com outras bactérias por espaço e alimento.
Ter cistite não significa ter maus hábitos de higiene. Na verdade, os dois extremos favorecem a infecção urinária: pouca higiene ou muita higiene.
Sabendo como surgem as infecções da bexiga, podemos agora fornecer algumas dicas de como evitá-las.
- Higiene íntima com moderação. Deve-se ter especial atenção à limpeza após as evacuações. Quem usa papel higiênico deve sempre realizar a limpeza da frente para trás, ou seja, na direção contrária à vagina.
- NUNCA realize ducha vaginal. Esse procedimento empurra as bactérias em direção à bexiga e favorece o aparecimento de cistite. A ducha anal pode ser usada, mas o ideal é tomar banho após a evacuação.
- Dê preferência a banhos de chuveiro; evite tomar banhos em banheiras.
- Evite desodorantes em spray na área genital ou qualquer outro produto de limpeza que possa irritar a vagina. Áreas inflamadas facilitam a aderência de bactérias.
- Sempre urine após relação sexual. O coito favorece a entrada das bactérias na uretra e o ato de urinar ajuda a expulsá-las.
- Beba bons volumes de líquidos ao longo do dia para urinar com frequência, “lavando” as bactérias da bexiga e uretra.
- Não use camisinhas que contenham espermicidas, pois elas não apresentam eficácia maior e ainda aumentam o risco de cistites. O mesmo vale para os diafragmas.
- O uso indiscriminado de antibióticos pode alterar a flora natural da vagina, facilitando infecções. Não tome antibióticos a não ser que seja realmente necessário. Nunca se automedique.
- Mulheres na menopausa devem usar cremes vaginais à base de estrogênio para reduzir o ressecamento da mucosa vaginal. A mucosa ressecada favorece o surgimento de lesões, que por sua vez propiciam a fixação de bactérias.
Para saber mais dicas sobre como evitar as cistites, leia: Como prevenir as infecções urinárias .
Fatores de risco
Apesar de todos os cuidados, algumas pessoas apresentam uma predisposição para infecções urinárias. Algumas mulheres têm infecção urinária de repetição, com vários episódios durante o ano. Entre os fatores que podem aumentar os risco de cistite, podemos citar:
- Diabetes Mellitus .
- Vida sexual ativa. Quanto mais relações sexuais por semana, maior o risco (leia: Cistite da lua-de-mel – Infecção Urinária Após Sexo ).
- Fatores genéticos e história familiar de cistite.
- Novo parceiro sexual.
- Presença de sonda vesical.
- Incontinência urinária .
- Doenças na próstata .
Sintomas
A infecção da bexiga causa alguns sintomas típicos:
- Ardência ao urinar, chamado de disúria .
- Urgência para urinar e dificuldade de segurar a urina.
- Vontade de urinar mesmo com a bexiga vazia.
- Sensação de peso na barriga.
- Presença de sangue na urina, chamado de hematúria .
Febre baixa e dor lombar também podem ocorrer, porém, sempre que esses sintomas surgirem deve-se pensar em pielonefrite, principalmente se a febre for alta e vier acompanhada de vômitos, perda de apetite e mal-estar geral.
Algumas pessoas associam uma urina com cheiro forte à infecção urinária. Isso na maioria das vezes não é real. A principal causa de cheiro forte é uma urina muito concentrada. Se sua urina está com um amarelo muito forte e com mau cheiro, você deve ingerir mais líquidos. Normalmente isso resolve o problema e ajuda evitar a formação de cálculos renais.
Nos homens idosos, as doenças da próstata podem causar sintomas semelhantes aos da infecção urinária, além de serem um fator risco para própria infecção urinária. Nos homens jovens com disúria é sempre importante pensar em DST como diagnóstico diferencial, já que neste grupo este tipo de infecção é mais comum do que cistites.
Para saber mais detalhes sobre os sintomas da infecção urinária, leia: Sintomas da infecção urinária.
O vídeo abaixo resume e explica os principais sintomas da cistite.
Diagnóstico
Na imensa maioria dos casos o diagnóstico da cistite é clínico e a maioria dos médicos prescreve tratamento sem solicitar nenhum tipo de exame. Se houver facilidade, pode-se solicitar uma rápida análise de urina para confirmar a presença de pus, mas esta não é obrigatória.
O exame definitivo para infecção urinária é a cultura de urina . Todavia, como esta demora entre dois a quatro dias para ficar pronta, e o quadro clínico costuma ser muito característico, na cistite este se torna um exame quase sempre desnecessário. A urocultura é muito mais importante na pielonefrite do que na cistite.
Na prática, mulheres jovens com ardência para urinar apresentam cistite até que se prove o contrário. Não está errado o médico prescrever antibióticos para infecção urinária sem pedir nenhum outro tipo de exame. Em 99% dos casos, esta conduta irá curar a paciente. Apenas nos casos de cistite de repetição, infecções em homens ou quando há dúvidas em relação ao diagnóstico é que a urocultura é importante.
Não se deve pedir urocultura em pessoas sem sintomas (exceto grávidas, explico mais à frente). Algumas pessoas apresentam bactérias em sua urina sem necessariamente desenvolverem cistite. Este quadro é chamado de bacteriúria assintomática. Portanto, não se pede urocultura e não se indica tratamento para pessoas sem sintomas de infecção urinária. O tratamento destes casos não traz benefício nenhum e ainda facilita o desenvolvimento de bactérias resistentes aos antibióticos.
Explicamos a bacteriúria assintomática com detalhes no artigo: O que é bacteriúria assintomática?
Tratamento
Toda cistite deve SEMPRE ser tratada com antibióticos para evitar recorrências e evolução para pielonefrite. Em geral, apenas três dias são suficientes. As drogas mais usadas são o Bactrim® (Sulfametoxazol + Trimetoprima) , um dos antibióticos da família das quinolonas (em geral ciprofloxacino ou norfloxacino), um derivado de penicilina (por 5 dias), fosfomicina (dose única) ou nitrofurantoína (por 7 dias). Em homens, o tratamento deve ser feito sempre por 7 dias, no mínimo.
Para mais informações sobre o tratamento da cistite, leia: Tratamento para infecção urinária.
Alguns medicamentos muito prescritos para cistites como o Cystex e a Pyridium não têm efeito antibiótico e servem apenas para aliviar temporariamente os sintomas da infecção urinária. Para tratar de verdade a cistite é preciso eliminar a bactéria, e isso só é possível com antibióticos.
A despeito de todos os cuidados listados neste texto, algumas mulheres apresentam infecções urinárias de repetição. São em geral pessoas com predisposição genética. Algumas dessas se beneficiam com a tomada de um comprimido de antibiótico após as relações sexuais. Nos casos mais graves, com várias infecções urinárias por ano, pode ser necessário cursos longos (até um ano) de antibióticos.
Para quem gosta de medicamentos naturais, uma frutinha chamada de Cranberry (oxicoco em português), da família das amoras, pode ajudar a reduzir o risco de infecções, apesar do seu real efeito ainda não ter sido efetivamente comprovado com grandes estudos controlados. O cranberry pode ser tomado como suco ou através de pílulas já à venda em algumas farmácias.
Outra opção para prevenção da cistite é o Uro-Vaxom, uma espécie de vacina com 16 cepas diferentes de E.coli. Parece que o uso por três meses deste medicamento reduz a ocorrência de cistites. É importante salientar que essa droga só funciona para aqueles que tem infecções de repetição pela E.coli . Se outra bactéria for a responsável pelas cistites, a vacina não tem efeito.
Infecção urinária em grávidas
A presença de infecção urinária em grávidas está associado a parto prematuro e bebês com baixo peso ao nascimento. Portanto, mesmo as gestantes com bacteriúria assintomática devem ser tratadas.
As quinolonas (ciprofloxacino e norfloxacina) são contraindicadas na gravidez e o Bactrim deve ser evitado, principalmente no primeiro trimestre. As melhores escolhas são a nitrofurantoína , fosfomicina ou amoxacilina + ácido clavulânico .
Para saber mais sobre infecção urinária na gravidez, leia: Infecção urinária na gravidez .
Referências
- International Clinical Practice Guidelines for the Treatment of Acute Uncomplicated Cystitis and Pyelonephritis in Women: A 2010 Update by the Infectious Diseases Society of America and the European Society for Microbiology and Infectious Diseases – Clinical Infectious Diseases .
- Bladder Infection (Urinary Tract Infection—UTI) in Adults – The National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases
- Acute simple cystitis in women – UpToDate.
- Acute simple cystitis in men – UpToDate.
- Mandell GL, et al. Urinary tract infections. In: Mandell, Douglas, and Bennett’s Principles and Practice of Infectious Diseases. 8th ed. Philadelphia, Pa.: Churchill Livingstone Elsevier; 2015.
Autor(es)
Dr. Pedro Pinheiro
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.