Illness name: gota
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O que é a doença gota?
A gota é uma forma comum de artrite (inflamação das articulações) que surge de forma episódica em pacientes com níveis elevados de ácido úrico no sangue.
Quando o paciente tem níveis elevados de ácido úrico no sangue por muito tempo, ocorre progressiva deposição de cristais de ácido úrico nas articulações. Esses cristais provocam inflamação da articulação, que fica inchada, avermelhada, quente e muito dolorosa. Esse quadro é chamado de artrite gotosa ou gota.
A crises de artrite gotosa são caracterizadas por ataques súbitos e severos que ocorrem de tempos em tempos, geralmente em uma das articulação do corpo de cada vez, sendo a articulação do primeiro dedo do pé (dedão) aquela mais frequentemente afetada.
Quando não tratada adequadamente, a gota pode, a longo prazo, causar graves deformidades devido à deposição crônica de ácido úrico nas articulações e na pele. Outra complicação possível é a insuficiência renal por acúmulo de cristais de ácido úrico nos rins.
Informações em vídeo
Antes de seguirmos em frente, assista a esse curto vídeo que explica os sintomas e as causas da gota.
Por que o ácido úrico causa gota?
O ácido úrico é uma substância produzida no fígado, derivada do metabolismo da purina, um composto orgânico presente em vários tipos de alimentos. Quanto mais purina ingerimos, mais ácido úrico é produzido pelo nosso organismo.
Durante a evolução das espécies, o ser humano perdeu a capacidade de produzir uma enzima chamada uricase, que transforma o ácido úrico em alantoína, uma substância muito mais solúvel no sangue. Como resultado, os humanos apresentam níveis de ácido úrico muito mais altos do que a maioria dos outros mamíferos. Os nossos níveis de ácido úrico sanguíneo só não atingem níveis tóxicos porque a maioria de nós consegue eliminar o excesso através dos rins.
Nas mulheres em idade reprodutiva, os níveis costumam ser um pouco mais baixos devido a influência do estrogênio, que potencializa a eliminação do ácido úrico pelos rins.
Apesar do bom trabalho dos rins, ainda assim os nossos níveis sanguíneos habituais de ácido úrico estão muito próximos do limite de solubilidade, fazendo com que pequenos aumentos na sua concentração causem precipitação (cristalização) deste nos tecidos.
O ácido úrico é mais solúvel em temperaturas acima de 37ºC, que é a temperatura do sangue. Todavia, nas nossas articulações a temperatura é mais baixa, chegando a 32ºC em algumas delas, o que favorece a deposição de cristais nestes locais (toque no seu joelho e compare a temperatura deste com as das coxas ou pernas). O ácido úrico se deposita nos tecidos na forma de urato de sódio.
Quando ocorre deposição de cristais de ácido úrico (urato de sódio) nas articulações, estes provocam uma intensa reação inflamatória levando a uma artrite (inflamação das articulações) muito dolorosa que recebe o nome de gota.
Resumindo: O ácido úrico mantém-se dissolvido no sangue até níveis próximos de 7,0 mg/dl. A partir deste valor, quanto mais elevada for sua concentração, maior é a chance de cristalização e deposição nos tecidos, principalmente nas articulações, que são as regiões de menor temperatura do corpo.
Caso a concentração sanguínea de ácido úrico continue se elevando, a cristalização pode passar a ocorrer mesmo em tecidos mais quentes, como a pele. É importante destacar, porém, que são necessários alguns anos de ácido úrico elevado para se desenvolver a doença gota.
Falamos mais sobre a hiperuricemia no artigo: TER ÁCIDO ÚRICO ELEVADO É PERIGOSO?
Sintomas do ácido úrico alto
A elevação do ácido úrico sanguíneo, chamada de hiperuricemia, não causa sintomas. Na verdade, mais de 2/3 das pessoas com ácido úrico elevado nem sequer desconfiam do fato. O fato de causar sintomas não significa, entretanto, que níveis elevados de ácido úrico não possam levar a complicações. As duas mais comuns são as crises gota e as pedras de ácido úrico nos rins.
Algumas pessoas com histórico de gota referem descamação das mãos e pés quando os níveis de ácido úrico estão elevados. Na verdade, não existe nenhuma comprovação de tal relação. Descamação das mãos e pés é geralmente causada por ressecamento da pele e não por ácido úrico elevado.
Sintomas da gota
A manifestação clínica da gota é a artrite, ou seja, inflamação de uma articulação, caracterizada por dor, vermelhidão, inchaço e calor local.
A gota é classicamente uma monoartrite, ou seja, uma artrite que atinge apenas uma articulação em cada crise. As articulações mais acometidas são as dos pés, principalmente o primeiro dedo do pé (dedão do pé) e joelhos.
A artrite da gota é tão dolorosa, que algumas pessoas não conseguem nem cobrir os pés, pois só o contato do cobertor com a área inflamada já causa uma fortíssima dor. Podem haver calafrios e febre, simulando um quadro infeccioso.
O ataque de gota dura alguns dias e depois desaparece espontaneamente. O intervalo entre a primeira e a segunda crise pode durar até dois anos. Se não for tratada, as crises de gota começam a ficar mais frequentes e intensas, podendo acometer mais de uma articulação por vez.
Gota tofácea
Ao longo dos anos, a gota não tratada leva à formação de tofos nas articulações, causados por deposição crônica de cristais de urato. Os tofos podem ser únicos ou múltiplos, levando a deformidades, como nas fotos ao lado e no início do artigo. Essa fase da gota é chamada de gota tofácea .
O excesso de ácido úrico também pode levar à formação de cálculos renais de ácido úrico. Existe também o risco de deposição de urato e formação de tofos nos rins, causando insuficiência renal crônica .
Como já explicado, a gota é causada por prolongados níveis elevados de ácido úrico sanguíneo. Porém, nem todo mundo que tem ácido úrico alto, desenvolve gota. Algumas pessoas mantém-se anos com níveis de ácido úrico maiores que 7 mg/dl e nunca apresentam artrite gotosa ou doença renal. O porquê disto, ninguém sabe.
A gota é muito mais comum em homens e ocorre entre 35 e 45 anos. Nas mulheres costuma ocorrer somente após a menopausa.
O diagnóstico da gota é feito quando há um quadro clínico típico associado a níveis elevados de ácido úrico. Quando há dúvida sobre a causa da artrite, o médico geralmente punciona o líquido da articulação inflamada, procurando pelos depósitos de cristais de urato.
Para ver imagens da artrite gotosa e da gota tofácea, acesse o seguinte link: IMAGENS DA DOENÇA GOTA .
Fatores de risco para gota
- Obesidade .
- Hipertensão .
- Trauma nas articulações.
- Longos períodos de jejum.
- Consumo de álcool .
- Grande ingestão de alimentos ricos em purina.
- Uso de medicamentos que aumentam o ácido úrico, como diuréticos .
Dieta para controlar o ácido úrico
Pacientes com gota ou com níveis elevados de ácido úrico devem ter uma dieta especial, evitando alimentos ricos em purinas.
Os alimentos ricos em purina (ácido úrico) são:
- Carnes: bacon, porco, vitela, cabrito, carneiro, miúdos (fígado, coração, rim, língua).
- Peixes e frutos do mar: salmão, sardinha, truta, bacalhau, ovas de peixe, caviar, marisco, ostra, camarão.
- Aves: peru e ganso.
- Bebidas alcoólicas.
Alimentos com moderada quantidade de purinas (ácido úrico) :
- Carnes: vaca, novilho e coelho.
- Aves: frango e pato.
- Frutos do mar: lagosta e caranguejo.
- Leguminosas: feijão, grão-de-bico, ervilha, lentilha, aspargos, cogumelos, couve-flor, espinafre.
Alimentos com baixo ou nenhum teor de purina (ácido úrico):
- Leite, chá, café, chocolate, queijo amarelo magro, ovo cozido, cereais como pão, macarrão, fubá, batata, arroz branco, milho, mandioca, sagu, vegetais (couve, repolho, alface, acelga e agrião), frutos secos, doces e frutas (mesmo as ácidas)
Tratamento e prevenção
O tratamento da gota se divide em duas fases: tratamento das crises e a profilaxia das crises. A gota não tem cura, mas pode ser muito bem controlada.
Tratamento da crise
Durante a crise de gota o tratamento é feito com anti-inflamatórios comuns (AINE) , corticoides e/ou colchicina.
A colchicina em doses baixas é menos tóxica do que os anti-inflamatórios (especialmente para os rins e estômago) e controla a gota eficazmente, mas pode causar efeitos colaterais desagradáveis, como náuseas, vômitos e diarreia. Esse efeito adverso é geralmente relacionado à dose usada, sendo menos comum em doses baixas.
Nos pacientes que não toleram AINE ou colchicina, uma opção é o uso de corticoides , potentes anti-inflamatórios de origem esteroidal.
A aspirina (ácido acetilsalicílico) deve ser evitada sempre que possível, pois a mesma, apesar de ter efeito anti-inflamatório, reduz a excreção de ácido úrico pelos rins.
Prevenção da crise
Uma vez cessada a crise de gota, o tratamento se volta para a diminuição dos níveis de ácido úrico. A droga mais usada para este objetivo é o alopurinol. É importante ressaltar que não se deve começar o alopurinol durante as crises, pois há risco de piora do quadro. O alopurinol durante as ataques de artrite só é aceitável se o paciente já fazia uso crônico dele antes do início da crise (leia: ALOPURINOL – Para Que Serve, Doses e Efeitos Colaterais ).
Sugere-se manter a colchicina para evitar novas crises enquanto os níveis de ácido úrico ainda não tiverem sido reduzidos pelo alopurinol. Podem ser necessários alguns meses de tratamento até se atingir valores desejáveis.
Uma outra opção para baixar os níveis de ácido úrico é a probenecida, um medicamento que aumenta a sua eliminação pelos rins. A probenecida não deve ser usada em pacientes com histórico de cálculo renal por ácido úrico.
Desde 2008 existe uma novo mediamento chamado Febuxostat, que serve de alternativa para os pacientes que não podem tomar nem alopurinol nem probenecida. O Febuxostat ainda não está disponível no Brasil.
Ácido úrico elevado sem sintomas – hiperuricemia assintomática
Como a maioria dos pacientes com ácido úrico elevado não desenvolve crises de gota ou cálculo renal, o consenso atual indica não usar alopurinol nestes casos. Só se começa tratamento com remédios se houver um primeiro episódio de crise de gota, cálculo renal, ou se os níveis de ácido úrico estiverem acima de 13 mg/dl no homem e 10 mg/dl na mulher.
Nos pacientes com hiperuricemia assintomática indica-se apenas uma alteração da dieta, visando evitar alimentos ricos em purinas.
Referências
- Clinical manifestations and diagnosis of gout – UpToDate.
- Asymptomatic hyperuricemia – UpToDate.
- Arthritis and Allied Conditions, 14th Edition, Koopman WJ (Ed), Lippincott Williams and Wilkins.
- 2015 Gout Classification Criteria: An American College of Rheumatology/European League Against Rheumatism Collaborative Initiative – Annals of the Rheumatic Diseases.
- EULAR evidence based recommendations for gout. Part I: Diagnosis. Report of a task force of the standing committee for international clinical studies including therapeutics (ESCISIT).
- EULAR evidence based recommendations for gout. Part II: Management. Report of a task force of the EULAR Standing Committee For International Clinical Studies Including Therapeutics (ESCISIT).
- Gout – Centers for Disease Control and Prevention.
- Management of Acute and Recurrent Gout: A Clinical Practice Guideline From the American College of Physicians.
Autor(es)
Dr. Pedro Pinheiro
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.